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OMS: pessoas que estão sob maior risco ao HIV não estão tendo acesso aos serviços de saúde que necessitam

- Claudia Bittencourt



Falhas no provimento de serviços adequados em HIV aos grupos-chave – homens que fazem sexo com homens, pessoas privadas de liberdade, pessoas que usam drogas injetáveis, profissionais do sexo e transgêneros – ameaçam o progresso global da resposta ao HIV, alerta a OMS.

As pessoas que estão sob maior risco de infecção pelo HIV ainda são aquelas com menos possibilidades de terem acesso à prevenção, exames e serviços de tratamento contra a doença. Em muitos países eles são deixados à margem dos planos nacionais contra o HIV, e leis e políticas discriminatórias são os maiores empecilhos ao acesso.

A OMS lançou hoje as “Diretrizes Consolidadas sobre Prevenção, Diagnóstico, Tratamento e Cuidados para o HIV para populações-chave”, na preparação para a Conferência Internacional sobre AIDS, em Melbourne, Austrália, que começará em 20 de julho.

Passos para reduzir novas infecções de HIV

Essas diretrizes delineiam os passos a serem seguidos para que os países reduzam o número de novas infecções do HIV e ampliem o acesso aos exames, tratamento e cuidados contra a doença para cinco ‘populações-chave’*. Elas incluem um amplo espectro de recomendações clínicas, que para serem efetivas, a OMS também recomenda que os países necessitam remover as barreiras legais e sociais que impedem que muitas pessoas tenham acesso aos serviços de saúde.

Pela primeira vez, a OMS recomenda categoricamente que homens que fazem sexo com homens tomem medicamentos antirretrovirais como método adicional de prevenção conta infecção pelo HIV (profilaxia pré-exposição)** conjuntamente ao uso de preservativos. As taxas de infecção por HIV entre homens que fazem sexo com homens permanecem altas em quase todo lugar e novas opções de prevenção são urgentemente necessárias.

Dados estimam que, globalmente, a incidência do HIV entre homens que fazem sexo com homens poderia ser reduzida de 20% a 25%, por meio da profilaxia pré-exposição, evitando até 1 milhão de novas infecções nesse grupo em 10 anos. Estudos indicam que mulheres, profissionais do sexo, têm 14 vezes mais chances de ser infectadas pelo HIV que outras mulheres, homens que fazem sexo com homens têm uma probabilidade 19 vezes maior de contrair a doença que a população em geral, e para transgêneros, essa probabilidade é 19 vezes maior do que para outros adultos. Para pessoas que usam drogas injetáveis, os estudos mostram que os riscos da infecção por HIV podem ser 50 vezes maiores que na população em geral.

“Nenhuma dessas pessoas vive isolada,” declarou o diretor do Departamento de HIV da WHO, Gottfried Hirnschall. “Profissionais do sexo e seus clientes têm esposos, esposas e parceiros. Alguns usam drogas injetáveis. Muitos têm filhos. Falhas no provimento de serviços de saúde para as pessoas que estão sob maior risco prejudicam o progresso contra a epidemia global e ameaça a saúde e o bem-estar de indivíduos, suas famílias e de toda a comunidade”.

Um progresso global continuado ainda é necessário

As diretrizes são publicadas ao mesmo tempo em que novos números reforçam a necessidade de um progresso global continuado sobre o HIV. Até o final de 2013, 13 milhões de pessoas estavam sob tratamento antirretroviral, sendo 11.7 milhões dessas pessoas vivendo em países de renda baixa ou média. Isso levou a uma queda de 20% nas mortes relacionadas ao HIV entre 2009 e 2012.

Mas enquanto o número de pessoas que morrem por AIDS está caindo abruptamente, os esforços preventivos estão muito aquém, particularmente entre as populações-chave.  

Há ainda lacunas significativas em relação ao tratamento dessa situação nos planos nacionais de HIV. No mundo todo, apenas 70% dos países pesquisados tratam explicitamente da questão dos homens que fazem sexo com homens e dos profissionais do sexo, enquanto que para usuários de drogas injetáveis os dados foram de 40%. Os trangêneros são raramente mencionados nos planos sobre HIV. E mesmo onde as políticas estejam presentes nos textos, é difícil para as pessoas terem acesso aos serviços que possam ajudá-las.

As populações-chave têm menos probabilidade ao acesso equitativo para tratamento de HIV. Por exemplo, em alguns locais da Europa Oriental, as pessoas que usam drogas injetáveis conformam mais da metade das pessoas vivendo com HIV, mas apenas um terço das pessoas vivendo com HIV têm acesso ao salva-vidas do tratamento antirretroviral.

Em muitos países, a discriminação é reforçada por legislação que criminalizam comportamentos sexuais, uso de drogas, expressão de gênero ou orientação sexual percebida. Por outro lado, onde a legislação e as políticas apoiam o acesso dessas populações-chave aos serviços para HIV, as doenças e as mortes relacionadas ao HIV entre esses grupos têm diminuído e as taxas de novas infecções permanecem baixas ou caíram, especialmente entre profissionais do sexo e para pessoas que usam drogas injetáveis.   

“Políticas audaciosas podem gerar resultados audaciosos”, afirma Rachel Baggaley, do Departamento de HIV da OMS. “A Tailândia foi um dos pioneiros dos programas que reconhecem a necessidade de manter os profissionais do sexo saudáveis e reduzir novas infecções por HIV. A Malásia, Espanha e a República Unida da Tanzânia conseguiram avanços importantes ao fornecer terapia substitutiva com opióides e programas de agulhas e seringas para pessoas que usam drogas injetáveis. Os dados mostram que onde há disponibilidade de uma combinação de efetiva prevenção e serviços de tratamento contra HIV para pessoas que usam drogas injetáveis, a transmissão do HIV entre essas pessoas é mínima”.

Essas novas diretrizes delineiam “amplos pacotes para HIV” para prevenção, diagnóstico, tratamento e cuidados para as cinco populações-chave e tratam de assuntos específicos e necessidades dos adolescentes desses grupos. Isso inclui medidas para gerenciar melhor a saúde sexual e reprodutiva, saúde mental, e co-infecções, tais como tuberculose e hepatite. Elas destacam a necessidade de programas de agulhas e seringas e a terapia substitutiva de opióides, e incluem recomendações para tratamento de overdose na comunidade.  

Na Conferência internacional sobre AIDS 2014, em Melbourne, a OMS convocará os países para re-energizar e fortalecer os programas sobre HIV de modo que todas as populações-chave possam se beneficiar dos avanços existentes na ampliação de tratamentos e programas sobre o HIV.

*Populações-chave são grupos definidos que, devido ao comportamento de alto risco, estão sob crescente risco de contrair o HIV independente do tipo epidêmico ou contexto local.  Além disso, elas geralmente possuem questões legais e sociais relacionados aos seus comportamentos que aumentam sua vulnerabilidade ao HIV. Essas diretrizes têm seu foco em cinco populações-chave.

** A profilaxia pré-exposição é um modo pelo qual pessoas que não tem HIV, mas que estão sob alto risco de contraí-lo, se previnem tomando uma única pílula (geralmente uma combinação de dois antirretrovirais) todo dia. Essa profilaxia, quando realizada consistentemente, tem mostrado uma redução do risco á infecção por HIV nas pessoas que estão sob alto risco de até 92%. Porém é menos eficiente se não for realizada com consistência.

Fonte: OMS