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Portadores da Síndrome de Down desmistificam preconceitos

- Claudia Bittencourt



A presença de um terceiro cromossomo 21 no DNA, que traz as informações genéticas, caracteriza a Síndrome de Down. A condição pode gerar déficits no desenvolvimento intelectual, especificamente, nos atrasos no campo da aquisição da linguagem, da cognição e comunicação, no desenvolvimento motor e na estatura, relacionados ao crescimento e ganho de peso. A hipotonia muscular (uma das características da síndrome) pode levar a um atraso no desenvolvimento das competências motoras de crianças com Síndrome de Down, tais como sustentar a cabeça, rolar, sentar, engatinhar, andar e correr. No dia 21 de março foi comemorado o Dia Internacional da Síndrome de Down, que faz alusão à trissomia do cromossomo 21.

A data tem como principal objetivo conscientizar a população sobre a inclusão e promover a discutição de alternativas para aumentar a visibilidade social das pessoas com Síndrome de Down. De acordo com o Censo 2010 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), cerca de 45 milhões de pessoas possuem alguma deficiência física ou mental no Brasil. Destas, estima-se que 300 mil tenham Síndrome de Down, que ocorre com uma prevalência de 1 para cada 600 nascimentos aproximadamente.

A agente de polícia, Giordana Garcia, é mãe do Théo, de 10 meses, que tem Síndrome de Down, e do Breno, de sete anos. Ela acredita que a data é uma oportunidade dos pais estimularem os filhos a tratarem crianças diferentes com o mesmo respeito. “É importante a divulgação do Dia Internacional da Síndrome de Down porque muita gente ainda pensa que as pessoas com a Síndrome são diferentes, incapazes e que não podem ser incluídas no meio social”, diz. Para a mãe, a inclusão das crianças com Síndrome de Down em escolas regulares e a orientação dos outros pais para os filhos são fundamentais para que os pequenos saibam conviver com uma criança diferente e não cometam bulliyng.

Giornada Garcia e família. Foto: Arquivo pessoal

O médico Karlo Quadros, pai da Ana Beatriz, de cinco anos, que também tem a síndrome, ressalta a importância do reconhecimento da diversidade humana e da garantia dos direitos das pessoas com deficiência. “Na Síndrome de Down, as características fenotípicas contribuem ainda mais para identificar a presença da deficiência intelectual. Na verdade, desde a década de 70, quando se começou a trabalhar um outro conceito de deficiência e não mais a deficiência enquanto impedimento, enquanto algo que o indivíduo carregasse com ele como uma desvantagem, que o indivíduo nasce com ela e carrega com ele, ao invés disso, a abordagem do modelo social. O modelo social é quando a deficiência existe, seja em diversos âmbitos, mas o obstáculo da pessoa com deficiência é muito mais da sociedade, que tem dificuldade em reconhecê-la como um elemento que faz parte da diversidade humana e que tem direito a todos os sistemas de proteção, de desenvolvimento social, educação, saúde e trabalho”, alerta.

O Théo e a Ana Beatriz já têm uma rotina movimentada com diversas atividades que estimulam o desenvolvimento. São sessões de fisioterapia semanais, estimulação precoce, fonoaudiologia e terapia ocupacional. A Coordenação Geral de Saúde da Pessoa com Deficiência (CGSPD) do Ministério da Saúde ressalta que as pessoas com Síndrome de Down têm direito, como qualquer outro usuário do Sistema Único de Saúde, ao acesso universal a qualquer estabelecimento e serviço ofertados. Com o intuito de ampliar e diversificar os serviços de atenção às pessoas com deficiência auditiva, física, intelectual, visual, ostomia e múltiplas deficiências, o Ministério da Saúde, por meio da Portaria GM/MS nº 793, de 24 de abril de 2012, instituiu a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência, no âmbito do SUS.

Karlo Quadros Nadja Quadros e os filhos Pedro Ulisses e Ana Beatriz. Foto: Arquivo Pessoal

Os cuidados em saúde poderão ocorrer em qualquer ponto de atenção da Rede SUS. Contudo, devido à complexidade que envolve a Síndrome de Down, parte dos cuidados em saúde estarão concentradas nos Centros Especializados em Reabilitação. Os serviços oferecidos prevêem uma abordagem interdisciplinar e o envolvimento direto de profissionais, cuidadores e familiares nos processos de cuidado. As estratégias para as ações são estabelecidas a partir das necessidades singulares de cada indivíduo, considerando o impacto da deficiência sobre suas funcionalidades, fatores clínicos, emocionais, ambientais e sociais envolvidos.

A funcionária pública, Ana Claudia Mendes de Figueiredo, mãe da Jéssica, de 23 anos, que tem Síndrome de Down, conta sobre os avanços e cuidados com pessoas com essa condição genética. “Minha filha nasceu em 1992. Eu, por exemplo, achava que ela nunca trabalharia, talvez não conseguisse ir para a escola e outras atividades que nós achávamos que seriam extremamente restritas para ela. Então, hoje, eu acho que os pais têm um acesso muito maior aos depoimentos de outros pais, acesso a informações, a sites científicos e pesquisas mais avançadas. Enfim, acesso a informações que nós não tínhamos há duas décadas e isso acaba trazendo uma tranquilidade maior e uma esperança maior de que vale à pena investir em uma estimulação precoce, na educação, no tempo com aquela criança, porque, com isso, ela certamente vai ampliar seu potencial em relação às várias áreas da vida”, ressalta.

Jéssica Mendes de Figueiredo. Foto: Arquivo Pessoal

Atualmente Jéssica Mendes de Figueiredo é formada em curso superior de fotografia e trabalha como relações públicas no Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CONADE). “O Dia Internacional da Síndrome de Down, pra mim, eu tenho Síndrome de Down, sabe? Mas eu ajo normal. Eu não me sinto com Síndrome de Down. Eu me sinto além da Síndrome de Down. Além do que eu vejo. Eu vejo além da síndrome, porque eu me sinto capaz de tudo. Eu tenho alcançado os meus sonhos, os meus objetivos, tudo. E pelas pessoas com Síndrome de Down. Eu tenho amigos também com Síndrome de Down, mas eu não vejo com aspecto de Síndrome de Down. É uma coisa além. É normal. A pessoa é de verdade. É assim o meu olhar. Eu vejo pessoas com capacidade de tudo, mesmo com Síndrome de Down, eu consigo me olhar daqui pra frente”, explica.

Rodoviária do Plano Piloto. Foto: Jéssica Mendes de Figueiredo

Jéssica conta, ainda, o que pensa sobre seu futuro. “O meu sonho é ser fotógrafa de moda, mas, para fazer isso, primeiro eu vou experimentar várias áreas da fotografia. Eu já fiz exposições de jarros de flores, porções de exposições que contêm um pouco da natureza. Agora no CONADE estou experimentando um pouco dos eventos do trabalho. Daqui pra frente eu me enxergo não como fotógrafa de moda, mas quero montar um estúdio fotográfico dentro da minha empresa, para administrar tanto o estúdio quanto moda. Eu penso nisso. Mas minha expectativa agora é ir preparando o meu caminho profissional para eu poder realizar meu sonho”, revela.

A identificação precoce de qualquer deficiência ou síndrome possibilita que o indivíduo tenha um prognóstico mais positivo em termos de ganho de independência e autonomia, uma vez que o processo de reabilitação e a elaboração de uma linha de cuidado em saúde se darão desde o início da vida. O SUS, além das ações específicas de reabilitação na atenção especializada, conta também com um conjunto de ações que visam a identificação precoce de possíveis deficiências, ampliada pelo Programa Nacional de Triagem Neonatal. Agora, além do já conhecido teste do pezinho, importante na identificação da Síndrome de Down, também fazem parte do programa a Teste da Orelhinha, para identificação de deficiências auditivas, e o Teste do Olhinho, para identificação de deficiências visuais.

Fonte: Blog da Saúde