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Campanha mobiliza a população contra o racismo no SUS

- Claudia Bittencourt



O governo federal coloca no ar a primeira campanha publicitária que busca envolver usuários e profissionais da rede pública de saúde na luta contra o racismo. Lançada nesta terça-feira (25) pelo Ministério da Saúde e Secretaria de Direitos Humanos, a ação visa conscientizar a população de que a discriminação racial também se manifesta na saúde.

O ministro da Saúde, Arthur Chioro, afirmou que a campanha tem como objetivo o enfrentamento do racismo institucional e o destaque à Política Integral de Saúde da População Negra. Ele avaliou que o grande desafio do Ministério da Saúde é produzir igualdade em meio à diversidade. “Não podemos tolerar nenhuma forma de racismo. Essa campanha é um alerta para os profissionais de saúde e para toda a sociedade brasileira. A desigualdade e preconceito produzem mais doença, mais morte e mais sofrimento. Nós queremos construir um país de todos e a maneira mais importante é falar sobre a desigualdade”, disse. O ministro ressaltou que o racismo se manifesta, muitas vezes, “em uma negativa do acesso, da informação adequada, e do cuidado”, disse.

Com o slogan Racismo faz mal à saúde. Denuncie!, as peças que serão veiculadas na TV, rádio, impresso e redes sociais incentivam as pessoas a não se calarem diante de atos de discriminação no Sistema Único de Saúde (SUS). Por meio do Disque Saúde 136 é possível denunciar qualquer situação de racismo ou obter informações sobre doenças mais comuns entre a população negra e que exigem um maior acompanhamento.

É o caso do diabetes mellitus (tipo II), cuja taxa de mortalidade, a cada 100 mil habitantes, afeta na população negra 34,1 habitantes, na população parda atinge 29,1 e, entre a branca, 22,7. A anemia falciforme, doença grave que deve ser diagnosticada precocemente por meio do teste do pezinho, é encontrada em maior escala entre a população negra, com incidência que varia de 6% a 10%, enquanto no conjunto da população oscila entre 2% e 6%.

Durante o lançamento da campanha, a ministra de Direitos Humanos, Ideli Salvatti, destacou os avanços da população negra. “Pela primeira vez a população negra e parda se autodeclara como sendo maioria no Brasil. Isso não é porque os negros e pardos se multiplicaram, é porque houve uma condição econômica, política e social de se reconhecerem assim”, afirmou a ministra. Ela salientou que “a promoção da campanha no SUS, e abre espaço para cada vez mais ampliar as políticas públicas dando igualdade de oportunidades a todos os brasileiros, independente da sua raça ou condição econômica, é uma questão central da democracia brasileira”.

Já o secretário de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde, André Bonifácio, lembrou os 10 anos de trajetória de construção da Política Integral de Saúde da População Negra, comemorados em 2014, e a participação dos movimentos sociais nesse processo. “A elaboração e execução dessa política aprimorou o relacionamento com o controle social. Permitindo conjugar forças importantes para tratar desse tema complexo que evolve apenas o Ministério da Saúde ou governo, mas toda sociedade”

O secretário da SGEP ressaltou, ainda, a importância da campanha para estimular a discussão sobre o preconceito e a desigualdade. Essa campanha não tem o objetivo de incentivar o denuncismo, mas sim de promover a reflexão sobre práticas reproduzidas no SUS. “Não é o SUS que é racista. O SUS expressa uma realidade produzida pela própria sociedade. E o racismo e a discriminação também são uma realidade social que se reflete na saúde.” Lembrando que os dados estatísticos mostram que a discriminação racial está presente no SUS e é um determinante social em saúde.

A criação da campanha foi motivada por relatos de discriminação e números que revelam a expressão do racismo no SUS, consequências do contexto social e histórico da população negra no Brasil. Dados do Ministério da Saúde demonstram que uma mulher negra recebe menos tempo de atendimento médico do que uma mulher branca. Enquanto 46,2% das mulheres brancas tiveram acompanhantes no parto, apenas 27% das negras utilizaram esse direito. Também 77,7% das mulheres brancas foram orientadas para a importância do aleitamento materno e apenas 62,5% das mulheres negras receberam essa informação.

As taxas de mortalidade materna e infantil na população negra são muito acima das registradas entre mulheres e crianças brancas. Dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde revelam que 60% das mortes maternas ocorrem entre mulheres negras e 34% entre as brancas. E, na primeira semana de vida, acontecem, em maioria, entre crianças negras (47% dos casos). Entre as brancas, representam 36%.

A secretária de Políticas para Ações Afirmativas da Secretaria de Políticas de Promoção de Igualdade Racial da Presidência da República (Seppir), Angela Nascimento, reconhece os avanços que têm permitido a inclusão da população negra, mas destacou que ainda há desafios a serem superados. “O tema racismo ainda encontra resistência nas nossas formações. Por isso, a campanha lançada hoje representa um passo importante enquanto compromisso institucional e o nosso desejo de construirmos juntos novas práticas”, complementou.

Além de divulgação da campanha publicitária em todas as mídias, será distribuído ainda folders para a população, que trazem números relacionados às mulheres e às crianças negras, além de informar sobre as doenças mais comuns na população negra.

MOVIMENTOS SOCIAIS – A importância do protagonismo dos movimentos sociais na construção da Política Integral de Saúde da População Negra também foi lembrado durante todo evento. A começar pela cerimônia de saudação a ancestralidade negra conduzida por representantes de comunidades de matriz africana, Tata InkcFrancisco e as yaloraixas Mãe Dora D’Yoá e Mãe Baiana D’Yoá, que abriu o evento antecedendo o pronunciamentos dos representantes do governo. 

“Esse é um momento de extrema importância para o nosso povo. Esse é um grande casamento, uma das melhores parcerias entre nós das religiões de matriz africana e o SUS. Mas é preciso que o SUS continue abrindo suas portas para nós, povo de terreiro, que também contribuímos com a saúde e que ajudamos cidadãos que sofrem e adoecem por conta do racismo”. Destacou a Adna Santos, “Mãe Baiana D’Yoá”, que também é a coordenadora no DF da Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (Renafro).

Representando os movimentos negros que estiveram presentes no lançamento, Maria Zenó Soares, da Federação Nacional das Associações de Pessoas com Doença Falciforme (Fenafal), destacou a importância da campanha para conscientização sobre o racismo na saúde. “É muito bom saber que por meio dessa campanha as pessoas poderão mudar seu conceito e seu olhar sobre o racismo, que muitas vezes não é percebido ou nominado como tal, mesmo por aqueles que sofrem essa discriminação.” 

NOVAS AÇÕES - Profissionais do Disque Saúde já passaram por treinamento para identificar as denúncias caracterizadas como racismo, que serão direcionadas aos órgãos competentes. O racismo não se apresenta necessariamente na forma de atitudes discriminatórias explícitas. Nas instituições pode ocorrer na forma de linguagem codificada (violência simbólica) e negligência (indiferença diante da necessidade). As dúvidas e denúncias registradas no Disque 136 também serão consolidadas e servirão para direcionar novas ações do Ministério da Saúde e da Secretaria de Direitos Humanos.

O Ministério da Saúde iniciou ainda duas novas ações para reforçar o combate ao racismo no SUS. Mais de 3,4 mil profissionais de saúde estão inscritos em módulo virtual de educação à distância sobre a 'Saúde Integral da População Negra', lançado em 22 de outubro. O curso virtual é gratuito e está disponível no site da Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS). O curso busca incentivar a produção e difusão de conhecimento sobre a promoção da saúde da população negra, enfoca especialmente o enfrentamento ao racismo institucional no SUS e as questões de saúde que mais afetam a população negra. O curso é auto-instrucional e tem a duração de 45 horas. 

Além do curso, outra iniciativa em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) foi a publicação de edital de apoio à pesquisa, que recebeu cerca de 100 projetos de pesquisa científica, tecnológica e de inovação voltados para Saúde da População Negra no Brasil.


POLÍTICA NACIONAL - O Ministério da Saúde firmou compromisso para a construção da equidade racial em saúde para a população negra ao instituir, pela Portaria 992/2009, a Política Nacional de Saúde Integral para a População Negra, cuja marca é: “reconhecimento do racismo, das desigualdades étnico-raciais e do racismo institucional como determinantes sociais e condições de saúde, com vistas à promoção da equidade em saúde”. O principal objetivo da Política, que é transversal às outras políticas, como Saúde da Mulher, Saúde da Criança, Saúde do Homem, é promover a saúde integral da população negra.

O tratamento pelo SUS de doenças que mais afetam a população negra, como é o caso da anemia falciforme, alcança cerca de 40 mil pessoas. O atendimento inclui exames de rotina, entre os quais, a eletroforese de hemoglobina, o dopllertranscraniano para prevenção do derrame cerebral e de sangue para controle da doença. Os medicamentos disponíveis são hidroxiuréia, ácido fólico, quelantes de ferro, analgésicos, anti-inflamatórios, antibióticos e vacinas de rotina e especiais. A cada ano, aproximadamente 2,4 milhões de recém-nascidos fazem o exame de Doença Falciforme pelo SUS, ou seja, uma cobertura de 83,2% das crianças que nascem no país.

No caso do diabetes, a população tem acesso a ações de prevenção e tratamento, desde a atenção básica até procedimentos de média de alta complexidade. São asseguradas gratuitamente as insulinas humana NPH – suspensão injetável 1 e humana regular, além de três medicamentos que ajudam a controlar o índice de glicose no sangue (libenclamida, cloridrato de metformina e glicazida).

As comunidades quilombolas são priorizadas no Mais Médicos do Ministério da Saúde, recebendo investimentos em infraestrutura e profissionais para atuarem nessas localidades. São 249 municípios com comunidades quilombolas atendidos pelo programa, que possuem um ou mais médicos, somando 1.630 ao todo.

 

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Fonte: Ascom SGEP

Fotos: Karina Zambrana - SGEP/MS